A palavra “Dislexia” deriva do Grego, o prefixo “dys”, que significa dificuldade e “lexis” palavra escrita.
Em 1887, o termo “Dislexia” foi usado pela primeira vez na cidade de Berlim pelo oftalmologista alemão que descreveu um caso de um paciente adulto, após ter tido um acidente vascular cerebral perdeu a sua capacidade de leitura, apesar de ter mantido o sentido da visão, da linguagem e da inteligência.
Em 1896, o pediatra inglês Pringle-Morgan usou o termo “Cegueira Verbal Congénita” para descrever o caso de um jovem de 14 anos possuidor de um quociente de inteligência elevado que por sua vez, apresentava uma incapacidade para a linguagem escrita.
Em 1917, o oftalmologista escocês Hinshelwood publicou uma monografia sobre esta perturbação. A designação de Cegueira Verbal deveria ser reservada para os casos mais severos, no qual propôs o termo de Dislexia Congénita para casos mais leves.
Nos anos 20, o conceito de disfunção cerebral mínima veio afetar a categorização das crianças com problemas de aprendizagem. A dislexia foi incluída num amplo conjunto de perturbações relacionadas com o desenvolvimento, denominadas dificuldades de aprendizagem. Este conjunto de perturbações incluía a dislexia, a hiperatividade, o défice de atenção, as perturbações cognitivas, as preceptivas e por fim as psicomotoras. Este conceito globalizante de dificuldades de aprendizagem criou sérios obstáculos à investigação sobre a etiologia, o diagnóstico, a prevenção terapêutica não só em relação à dislexia, mas também em relação a todas as outras perturbações de desenvolvimento.
Em 1937, o neurologista americano Samuel Orton desenvolveu um trabalho de grande relevância tendo em conta às suas investigações terem sido apresentadas em perspetivas inovadoras. Inicialmente pensou-se que esta dificuldade seria causada por um problema derivado no sistema visual.
Os sinais mais evidentes na dislexia manifestava-se na escrita por substituições de letras, de erros de sequência, sendo utilizado o termo “Estrefossimbolia”. Posteriormente apercebeu-se da relação entre a dislexia e a linguagem oral que passou a utilizar a designação de “Alexia do Desenvolvimento” que se preconizou numa necessidade de intervenção terapêutica individualizada, estruturada e orientada para um sistema sequencial acumulativo.
Em 1949, em homenagem a Orton, foi fundada a “Orton Dyslexia Association” precursora da atual Internacional Dyslexia Association. Esta associação tem dado um enorme contributo para a investigação e divulgação de novos conhecimentos científicos.
Nos anos 30 e 40 surge novas perspetivas neurológicas para as áreas educacionais e sociais. As dificuldades ao nível da leitura passaram a ser compreendidas numa perspetiva social, e não num quadro médico ou clínico.
Nos finais dos anos 40 e 50 o “Instituto de Cegos para as Palavras” localizado na cidade de Copenhaga, começou a estudar um modo mais sistemático das causas da dislexia de forma a implementar programas reeducativos. Hallgren B. no ano de 1950 realizou vários estudos sobre as famílias com dificuldades de leitura e de escrita no qual criou o conceito de dislexia constitucional.
Nos anos 60 sob a influência das correntes psicodinâmicas e pedagógicas ativas, foram minimizados os aspetos biológicos da dislexia. As dificuldades de leitura foram atribuídas à imaturidade, atendendo aos problemas emocionais, afetivos e pedagógicos constituíram num todo, mais um obstáculo não só à investigação, mas também à implementação de programas reeducativos eficientes.
Nos anos 70 os psicolinguistas, identificaram uma estreita relação entre a linguagem escrita e a linguagem falada. A hipótese da existência de um défice linguístico ao nível do processamento fonológico começou a ser investigado. Os resultados dos diversos estudos mostraram que as crianças com dislexia relevavam dificuldades de relação do nome com as letras associadas aos seus sons, sendo um pré-requisito fundamental para a descodificação das palavras escritas.
Em 1992, Hulme e Snowling definiram a dislexia como uma parte contínua das perturbações da linguagem caraterizada por um défice no processamento verbal ao nível sonoro.
Nas últimas décadas, os estudos realizados com as modernas tecnologias de imagem, de ressonância magnética funcional, (fMRI) permitiram observar o funcionamento cerebral durante as atividades de leitura. Os resultados destes estudos vieram proporcionar uma prova visível e incontornável da existência de uma perturbação da leitura e da escrita definida por dislexia e disortografia.
A perturbação poderá ter origem numa génese neurobiológica causada por um défice fonológico derivado ao funcionamento das zonas cerebrais intervenientes nas atividades de leitura. Os resultados apresentados pela neurocientista Sally Shaywitz da Universidade de Yale, com o tema “Overcoming Dyslexia” no ano 2003, têm sido bastante consistentes nas suas investigações, como também outros cientistas, como Bradley, Bryant, Uta Frith, Hulme, Snowling, Torleiv Hoien, Lundberg. Um conjunto de estudos neuroanatómicos, neurocognitivos e genéticos verificam a existência da dislexia a partir de uma situação inexplicável. Alguns professores, médicos e psicólogos continuam a negar a sua existência. Esta situação incompreensível tem dificultado a divulgação do conhecimento científico e prejudicado seriamente as crianças disléxicas em situação escolar impossibilitando-as de receberem uma intervenção educativa especializada ajustadas às suas necessidades educativas especiais. A dislexia mereceu a atenção necessária da comunidade científica, bem como, a sua definição tem sido uma questão recorrente.
Em 1968 a Federação Mundial de Neurologia decidiu pela adoção do termo de dislexia do desenvolvimento no qual elaborou a seguinte definição:
“Uma perturbação que se manifesta por dificuldades na aprendizagem da leitura, apesar das crianças serem ensinadas com métodos de ensino convencionais, por possuírem uma inteligência normal, com oportunidades socioculturais adequadas. Os problemas são causados por défices cognitivos básicos que são frequentemente de origem constitucional”.
Para a grande maioria dos agentes educativos, esta definição corresponde a uma experiência de conhecimentos que se apresenta por critérios inclusivos. A ausência de critérios inclusivos tem repercussões negativas a dois níveis:
- A nível prático limita a sua utilização, pois dificulta o diagnóstico e a consequente implementação de programas reeducativos.
- Ao nível do enquadramento legal, o reconhecimento da dislexia como um défice cognitivo básico ou um défice cognitivo-linguístico, sem critérios precisos de inclusão, dificulta a categorização dos alunos disléxicos prejudicando a adoção das medidas reeducativas mais adequadas.
Em 1994, o manual diagnóstico e estatístico das doenças mentais enquadra pela primeira vez a dislexia ao nível das perturbações da aprendizagem e utiliza a denominação de perturbação da leitura e da escrita estabelecida pelos seguintes critérios de diagnóstico:
- O rendimento na leitura e na escrita é medido através de provas normalizadas. Situa-se substancialmente abaixo do nível esperado para a idade do sujeito cujo quociente de inteligência e de escolaridade seja adequado ao seu nível etário.
- A perturbação interfere significativamente com o rendimento escolar, ou em atividades da vida quotidiana que requerem aptidões de leitura e de escrita.
- Se existe um défice sensorial essencial às dificuldades mas que sejam excessivas.
- A utilização de critérios de discrepância em relação ao nível cognitivo é contestada por diversos autores.
Segundo Fletcher 1994, defende um diagnóstico de dislexia que requer uma discrepância entre o quociente de inteligência e o nível de leitura. Se existem dois grupos distintos de maus leitores, em que um grupo apresenta maus leitores inteligentes com dislexia e outro grupo de maus leitores com funcionamento intelectual deficitário de baixo nível de quociente de inteligência cujo resultados de diversos estudos têm mostrado que o défice ao nível fonológico e ortográfico não difere nos dois grupos, sendo portanto independente do quociente de inteligência.
Em 2000, Hoien e Lundberg apresentaram a seguinte definição de dislexia: “Dislexia é uma perturbação em certas funções da linguagem que são importantes para a utilização do princípio alfabético essencial na descodificação das palavras. Esta perturbação surge inicialmente como uma dificuldade na descodificação automática das palavras no processo de leitura. A perturbação também se manifesta numa pobre capacidade de escrita. A perturbação disléxica é geralmente determinada ao nível da transmissão familiar no qual existe uma probabilidade de uma predisposição genética. Outra característica da dislexia é a sua persistência ao longo da vida. Embora a capacidade de leitura possa atingir um nível aceitável de dificuldades ortográficas sentida pelos alunos disléxicos que se mantêm estável na maioria dos casos. A realização de testes de competências fonológicas permite verificar se esta incapacidade persiste no aluno, ao longo da sua vida adulta.
De uma maneira mais simples, define-se a dislexia como uma perturbação persistente na descodificação da linguagem escrita que tem a sua origem num défice do sistema fonológico.
A dislexia é uma dificuldade significativa na descodificação das palavras e na escrita que tem a sua origem num défice do sistema fonológico. Para Fletcher e Siegel a definição tem uma base de critérios de discrepância definidas em pessoas disléxicas, independentemente da sua capacidade intelectual. Há pessoas com elevados níveis intelectuais que têm dislexia, tal como há pessoas menos dotadas que não têm quaisquer dificuldades em adquirir boas competências de descodificação. Os estudantes com baixas capacidades cognitivas, défices sensoriais, ou perturbações emocionais, também podem vir ter dislexia, nestes casos os défices extras irão exacerbar num problema de leitura.
Em 2002, Uta Frith, apresenta uma perspetiva em consideração ao contexto cultural em que se refere ao critério das manifestações sintomáticas, que por si só, não parece ser um critério adequado para definir a dislexia ao longo da vida.
Os comportamentos se modificam ao longo do tempo, também os sintomas da dislexia melhoram com as aprendizagens e as intervenções compensatórias, apesar do défice fonológico esteja subjacente em persistir ao longo da vida. Segundo Uta Frith 2000 define a seguinte definição:
“Dislexia é uma desordem neuro-desenvolvimental, que existe desde o nascimento com diferentes manifestações ao longo do desenvolvimento”. Os conhecimentos acumulados nos diversos estudos sobre dislexia indicam que a dislexia não é uma perturbação que aparece em idade escolar e que desaparece na vida adulta. Não é uma preocupação exclusiva da infância, é um problema que se tem de carregar por toda a vida.
Em 2003, a Associação Internacional de Dislexia, em colaboração com os investigadores do National Institute of Child Health and Human Development, desenvolveu uma definição concreta da seguinte forma:
Dislexia é uma incapacidade específica de aprendizagem, de origem neurobiológica. É caraterizada por dificuldades na correção e na fluência da leitura de palavras por baixa competência leitora e ortográfica. Estas dificuldades resultam de um défice fonológico, inesperado, em relação às outras capacidades cognitivas e às condições educativas. Secundariamente podem surgir dificuldades de compreensão de leitura por falta de experiência promove um reduzido desenvolvimento do vocabulário e dos conhecimentos gerais.
Esta definição vem evidenciar que a principal caraterística da dislexia são as dificuldades ao nível da leitura e da ortografia sendo dificuldades originadas por um défice fonológico, estando intactas em todas as outras competências cognitivas.
Começa a emergir um consenso em relação a uma definição mais abrangente de dislexia como uma perturbação neurodesenvolvimental de origem biológica, com impacto no processamento da linguagem, que envolvem uma série de manifestações clínicas. Existem provas da existência de uma base genética e cerebral evidente que se manifesta para além dos problemas da linguagem escrita.
A influência dos fatores ambientais é muito importante, há contextos em que a perturbação quase não transparece, enquanto noutros é geradora de grande sofrimento. Existe uma grande variabilidade intra e inter-individual da dislexia que se situa numa continuidade de dificuldades que vão desde as mais ténues até às mais severas.
O modelo de distribuição da dislexia tem por base estudos realizados em populações escolares que demostram um modelo da curva normal onde existe uma correlação entre a população disléxica e não disléxica. Segundo este modelo, tal como acontece com muitas outras doenças, como a hipertensão e a obesidade, não é possível estabelecer limites precisos. A dislexia é ilimitada nas dificuldades de leitura com diferentes graus de severidade.
Christopher Brandão, 2016
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