quinta-feira, 23 de junho de 2016

O Produto Social Da Infância Abandonada

O produto social da infância abandonada identifica-se em três fases distintas de evolução:
- A primeira fase tem caráter solidário.
 - A segunda fase apresenta-se por um caráter filantrópico.
- A terceira fase é caraterizada pelo bem-estar social e psíquico da criança
Movidas pelo sentimento paternalista, a fase solidária associa-se ao período colonial até meados do século XIX, onde se inicia a assistência de crianças abandonadas e ilegítimas.
 As mudanças sociais realizadas pela assistência de origem religiosa, cujo ato de caridade era em prol da beneficência, no qual recolhiam os recém-nascidos deixados próximos das casas, das igrejas, ou de outros estabelecimentos alternativos, onde a recompensa dos benfeitores era a salvação das suas almas pecadoras.
A partir do século XVIII, as famílias ou os indivíduos pertencentes às Misericórdias, sustentavam as crianças abandonadas, e por sua vez começaram a enfrentar problemas administrativos e financeiros.
Com o liberalismo da sociedade, houve uma tendência de agir solidariamente, que foi diminuindo ao longo do tempo. Assim, surgiu a fase filantrópica na assistência às crianças pobres que passaram a depender financeiramente dos governos e que por sua vez, passou a controlá-las por meio de normas às respetivas instituições de solidariedade.
A última fase da assistência à infância abandonada surgiu no final do século XX. Os governantes no poder político introduziram o conceito do bem-estar social que passou assumir um papel de responsabilização para todos aqueles que cuidam e protegem as respetivas crianças abandonadas.
A assistência às crianças em situação de desamparo, aconteceu efetivamente com a aprovação do estatuto da criança pelo Ministério Da Justiça. Começaram a ser consideradas sujeitos com direitos por lei estabelecida no campo das políticas de assistência da população infantojuvenil que necessitasse de proteção jurídica do Estado.
A assistência infantil é passível de uma análise histórica descontínua que possibilite a sua construção demagógica. Sendo assim, os três períodos assistenciais apresentados, interessa-nos realçar a fase solidária em que se situa todo o contexto histórico. O objetivo das práticas de proteção dispensadas às crianças em situação de abandono iniciou-se na Idade Média, onde já se constatava o abandono em massa e o aborto massivo, consideradas como práticas sociais repugnáveis. Os hospitais passaram a receber e assistir crianças desamparadas. Existe uma situação histórica sucedida ao lado do Vaticano, onde existia um hospital destinado acolher os expostos a mando do Papa Inocêncio III datada entre os anos 1198 a 1216 que comoveu a comunidade daquela época, após ter conhecimento dos pescadores que haviam retirado do rio Tibre um grande número de bebês vítimas de infanticídio. A prática de abandonar os filhos não era comum entre os indígenas e os escravos, esse costume chegou aos países da América do sul por um processo de colonização realizado pelos Portugueses e Espanhóis, com enorme influência da igreja católica, quebraram as normas e os valores ético morais daquela sociedade. Assim, as relações maritais foram controladas pelos teólogos e legisladores que aplicaram diversas regras morais e leis civis de forma a propagar o sagrado casamento realizado pela igreja católica. O Concilio de Trento promulgou leis a favor do casamento, por outro lado, também reafirmaram a legitimidade do casamento como uma forma de disciplinar ou controlar os desejos carnais, embora não fosse o ideal para a santidade, casar era uma alternativa para aqueles que não conseguiam conter os seus instintos sexuais mesmo em relações aprovadas pela igreja, seriam controlados os instintos por meio do confessionário. A catequese foi o instrumento de normalização dos desvios comportamentais dos indivíduos, de forma pudesse ser interiorizada as boas condutas. O sexo deveria ter por finalidade a reprodução que justificasse os seus fins. Além disso, o casamento representava a conservação da estrutura social definida pela sociedade, o meio pelo qual os preceitos religiosos eram introduzidos nos lares entre os fiéis. 
Nesse contexto, as relações sexuais que não se encontravam dentro dos parâmetros morais instituídos pela igreja eram sancionadas na prática de crime.
 O Santo Oficio e os Tribunais Eclesiásticos solicitaram muitos processos por conta de homens e mulheres que não prosseguiam em consonância com a fé cristã sobre o tema da sexualidade, contudo o concubinato e outras relações classificadas como ilícitas que existiam em grande número na sociedade portuguesa, principalmente entre a população pobre e escrava. O custo do casamento teria sido um dos estorvos para a realização de normas que regulasse as relações conjugais, excluindo todos aqueles que não podiam pagar pela cerimónia.
A pressão exercida pelos religiosos para o enquadramento das boas condutas humanas, talvez fosse um dos fatores que levou à exposição de crianças geradas a partir de concubinato e adultério que eram práticas reprovadas socialmente, no qual, muitos bebês eram abandonados por questões éticas e morais. Entre mulheres brancas, o enjeitamento era ainda mais usual nas mulheres brancas da alta sociedade e solteiras, por terem maior sofrimento com o controle da sua moral por parte da sociedade, temendo inclusivamente pela sua própria vida. Esta tendência era menor entre os casais pobres cujos filhos significavam mão-de-obra barata para as tarefas domésticas e agrícolas. O abandono de crianças foi um fenómeno eminentemente urbano, considerado o locus horrendus da alta sociedade branca devido ao seu poder totalitário.

O meio rural é caraterizado por uma economia de subsistência das famílias numerosas pobres que se alternavam no cuidado das crianças mais jovens, para que mais tarde colaborarem nas tarefas agrícolas. As crianças não poderiam ser aproveitadas de igual maneira nos centros urbanos, pois nestes locais, a produção era exclusivamente industrial e exigia uma determinada especializacão  da mão-de-obra profissionalizada.
Christopher Brandão, 2016

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